Lentes manuais? Sim, por favor!"

Hoje em dia damos muita coisa como garantida no mundo da fotografia. Coisas como foco automático, deteção facial ou deteção de olhos, o uso de inteligência artificial, estabilizador na objetiva e no corpo da câmera, e por aí adiante.

Sempre fui defensor de que o que importa é o fotógrafo, não o equipamento e, até um ponto, isto é verdade. Claro que o equipamento importa em muitos cenários, e em certas situações é mesmo essencial e imprescindível ter determinada câmera, uma objetiva específica ou um setup de luzes próprio.

Porém, regra geral, a perícia do fotógrafo é que faz uso da tecnologia para conseguir os melhores resultados.

Recentemente, decidi que iria voltar ao passado e experimentar objetivas de foco manual e comprei 2 para testes – Meike 50mm f/2 e uma 7Artisans 55mm f/1.4, ambas para montagem X da Fujifilm – e até agora têm sido uma agradável surpresa e um prazer de usar.

Meike MK 50mm f/2 e 7Artisans 55mm f/1.4


“Caráter”...

Claro, não são as objetivas mais nítidas na sua abertura máxima (mas também não faço grandes intenções de usar acima de f/2.8. Malta, nem tudo tem de ser feito com abertura máxima), nem são as mais fáceis de usar para quem está habituado ao autofocus.

Meike 50mm f/2 e 7Artisans 55mm f/1.4

Não obstante, têm o dito “caráter” e é preciso esclarecer aqui que para o tipo de fotografia que aprecio e que faço eu não preciso de algo super nítido e raramente estou a usar aberturas acima de f/5.6 porque quero contar uma história com a minha foto e para isso dá-me jeito, por vezes, ter mais do fundo focado. Se tiver de fazer retratos, a abordagem é outra e aí sim vou usar aberturas mais altas como f/2.8 ou f/2.

Outro factor que contribui para o “caráter” da objetiva é o seu aspeto geral. Esteticamente, este tipo de equipamento costuma ser muito apelativo, bem como pequeno e leve. Para quem procura carregar menos peso, regra geral, é uma opção viável.

Por fim, existem muitas lentes “vintage” por aí que podem ser adaptadas às câmeras digitais. Com o ressurgimento do analógico e a procura pelo visual mais antigo dos anos 60, 70, 80, etc. há cada vez mais oferta no campo das objetivas antigas e manuais. Embora muito possa ser feito em pós-produção no editor, por que não experimentar ter o look diretamente da câmera? é algo a considerar.


Abrandar...

Algo em que reparei ao usar este tipo de objetiva é que de facto nos obriga a abrandar um pouco o nosso processo creativo. Tiro mais tempo para compor a fotografia, penso mais no tipo de foto que quero tirar e também preocupo-me mais em observar o meu redor, de modo a fazer a foto contar.

Com estas objetivas aprendi também a fazer zone focusing, técnica particularmente útil na fotografia de rua, que consiste em estabelecer a abertura e com uso das marcas na objetiva determinar antemão que zona da fotografia estará em foco quando disparamos. Por exemplo, na minha 7Artisans eu posso definir uma abertura de f/5.6 e sei pelas marcas que posso ter tudo entre 0.6m e 1.5m em foco, ou 1.5m ao infinito, etc. Facilita muito usar este método em fotografia de rua.

Certamente, continuarei a usar uma maioria de objetivas com autofocus e que sejam emparelhadas com a minha câmera no dia a dia, mas por vezes sabe bem simplesmente abrandar e fazer o esforço adicional enquanto fotógrafo. No fim de contas, vai ajudar-me a ser melhor no que faço.


Preço...

Tirada com a 7artisans a f/2.8

Outro motivo que me levou a escolher usar objetivas manuais foi o preço das mesmas. Embora as objetivas para o sistema fujifilm sejam, no geral,  baratas em comparação com outros sitemas (especialmente se forem full frame), as manuais são uma fração do preço. Por exemplo, adquiri a Meike por 70€ em segunda-mão e a 7 Artisans por 139€ com portes.

Isto é incrivelmente útil para quem tem menos fundos com que gerir a sua fotografia (é muitas vezes o meu caso).

Adicionalmente, eu queria ver gostaria de uma determinada distância focal e assim posso experimentar sem “quebrar a banca”.

Se gostar, gostei e talvez compre depois uma objetiva automática para certos trabalhos. Se não gostar, fiquei com uma objetiva divertida de usar e não gastei 500 a 1000€.


Desvantagens...

Nem tudo é bom com este tipo de equipamento. Conforme disse acima, a escolha vai depender muito do tipo de fotógrafo e daquilo que para cada um de nós é aceitável a nível de compromisso. A qualidade pode nem sempre ser a desejada, a lente pode ter as suas imperfeições (o que lhe confere caráter, mas retira usabilidade em algumas situações), na maioria dos casos estas objetivas não têm selagem contra humidade e poeira.

Há também uma maior probabilidade de perder “aquele momento” devido à lentidão em focar. É algo que pode ser mitigado com prática e zone focusing, mas nunca é prevenível na totalidade.

Normalmente, e friso normalmente, este tipo de objetivas são de distância focal fixa. Se por um lado, isso obriga o utilizador a desenvolver a sua criatividade e a trabalhar com certos constrangimentos, por outro lado pode ser incómodo para outras pessoas.

 

No fim do dia, não são para toda a gente, mas acredito que estas peças têm as suas vantagens e que também não perdem nada em experimentar pegar numa, abrandar um pouco e talvez aprender algo novo. Como em muita coisa, é preciso abordar este material com uma expectativa realista e com noção dos trade-offs que estamos a fazer. Eu sei que não vou ter da minha 7 Artisans 55mm o que a Fujinon 56mm WR me oferece, e está tudo bem.

Aconselho sempre a lerem e verem reviews online antes da compra.

 

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